Blog Boviplan

Creep feeding, ferramenta multiuso: Técnica favorece desde desmama pesada até produção de boi-China a pasto

Muitos pecuaristas ainda se perguntam isso, ao pensar no custo da técnica de suplementação de bezerros durante a fase de aleitamento. A dúvida está, frequentemente, associada ao custo com instalações, suplementos e mão de obra, que, na ausência de uma estratégia bem definida, parecem altos. Técnicos ouvidos por DBO reforçam: quem investe em creep feeding deve ter objetivos claros, como desmamar bezerros mais pesados, para vendê-los a preços melhores; incrementar o índice de prenhez das vacas; antecipar a desmama; produzir tourinhos com melhor condição corporal ou acelerar o ciclo pecuário. Cada produtor pode definir seus objetivos, mas nunca trabalhar às cegas, pois isso torna a análise da técnica enviesada.

Instalação na Fazenda Barrinha, em Bocaina, SP: reforço para o Nelore de seleção.

O criador Jorge Sidney Atalla Júnior, de Bocaina, região central de São Paulo, tem duas propriedades e usa o creep há cinco anos, visando principalmente desmamar bezerros pesados. Na primeira fazenda, a Barraquinha, faz cruzamento industrial, produzindo 600-650 animais Angus/Nelore, que atingem média de 275 kg (machos) e 265 kg (fêmeas) à desmama. São números excelentes, que lhe permitem vender seus animais por preços até 10% acima dos de mercado, em função de sua qualidade. Isso já é uma grande vantagem, mas, considerando-se apenas a diferença de peso obtida com o creep (40 a 45 kg a mais em relação aos não tratados), conclui-se que a técnica que se paga. Com o quilo do bezerro cruzado a R$ 9, esses 40 kg extras geram receita de R$ 360/cab. Assumindo-se um desembolso diário com ração de R$ 0,56 e 245 dias de consumo, tem-se um custo de R$ 138,67. Ou seja, sobram R$ 221,33 por cabeça, sem considerar outros custos e ponderações (veja mais números no quadro).

Tourinhos mais pesados

“Para mim, o creep feeding é um caminho sem volta”, garante o criador, frisando, porém, que o bom resultado obtido não se deve apenas à suplementação, mas decorre do bom manejo de pastagens, com adubação, e da seleção genética das fêmeas Nelore, que ele seleciona há vários anos. Em sua segunda fazenda, a Barrinha, ele mantém um plantel de 1.000 matrizes registradas (PO e POI), para produção de 600 animais/ano. Nessa propriedade, ele támbém usa creep feeding, mas com outro objetivo: vender reprodutores, em leilão, com excelente condição corporal: 650 kg aos 22 meses de idade.

Antes de usar a técnica, os animais só atingiam esse peso aos 36 meses. “Para ter um diferencial no mercado, eu precisava desmamá-los com mais de 240 kg. Hoje, minha média, nos machos Nelore, é de 265 kg”, comemora. A estratégia comercial deu certo. Segundo o Banco de Dados da DBO, os três últimos leilões anuais do Condomínio Jorge Sidney Atalla, realizados no mês de junho, vêm apresentando média crescente de preço, saindo de R$ 6.300 em 2017 (76 machos) para R$ 8.000 em 2019 (172 machos). Tanto no gado cruzado quanto no PO, o creep ajuda a aumentar a produtividade, fundamental em uma região de terras mais caras como Bocaina, cercada pela cana de açúcar. “A produção de minhas fazendas precisa ser competitiva”, explica Sidney.

O manejo no creep feeding é idêntico para as duas fazendas: o suplemento começa a ser fornecido aos 60 dias de vida, prosseguindo até a desmama; projeta-se um consumo médio na proporção de 0,3% do peso vivo, com limite de consumo de até 1 kg/dia. O produto é composto por farelos (soja e milho), núcleo mineral e ureia (total de 20% de PB). O cocho para os bezerros fica perto do cocho das mães, dentro da área de lazer dos módulos de rotacionado de 25 ha, formados com MG-5, Piatã e Aruanã.

Jorge Atalla Júnior faz IATF (dois protocolos, com repasse com touros), mas diz não ter observado efeitos indiretos do creep sobre a taxa de prenhez das vacas, como apontam alguns técnicos. Na opinião do criador, o maior benefício do creep é o bom peso à desmama, porém ele faz um alerta: “A cria ainda é a fase mais barata para se suplementar, mas não adianta pegar um animal desmamado com 260 kg e jogá-lo em pasto ruim, só com sal mineral. Faço a recria dos meus Nelore com proteinado até a puberdade, para que as fêmeas emprenhem mais cedo e os tourinhos cheguem pesados ao leilão”, informa.

Ganho contínuo

André Aguiar, da Boviplan Consultoria Agropecuária, de Piracicaba, SP, concorda com Atalla Júnior. Segundo ele, para encurtar o ciclo produtivo, objetivo número um das fazendas de pecuária, é preciso ter ganhos contínuos, especialmente se a meta é antecipar a idade ao abate para 16-18 meses (novilhos precoces). “Acho que o creep feeding vale a pena para quem vende bezerro por quilo, mesmo que o ágio não se mantenha em 30-50%, e é ferramenta essencial para encurtar o ciclo produtivo”, diz.

A Fazenda Novo Horizonte, em Araguapaz, no noroeste de Goiás, tem usado a técnica com as duas finalidades, conforme oportunidades de mercado. “Se a @ de bezerro estiver alta, vendo à desmama. Se as contas forem favoráveis à terminação, sigo até o abate”, explica Jairo Augusto Perillo, gestor da empresa, que voltou a fazer creep feeding há quatro anos, após ter usado a técnica “lá atrás, na época áurea do cruzamento industrial”. Desde então, ele desmama animais cruzados com 250-240 kg , vendidos pelo quilo de peso vivo.

Bezerros cruzados no creep, em Araguapaz, GO: em busca do “boi-China”.

Em 2019, animado com o boi-China, decidiu terminar os animais em semiconfinamento. Eles foram direto do creep para a recria com proteinado, na proporção de 0,1% do peso vivo durante a seca. Depois, receberam apenas mineral com 80 g de fósforo até o abate. No final de maio, Perillo enviou o primeiro lote de 60 animais gordos para o frigorífico, pesando 20,6@ (machos) e 14,7@ (fêmeas). “Só sete não deram boi China”, orgulha-se. Ao contrário de Atalla Júnior, ele observa um efeito positivo do creep sobre a taxa de prenhez das vacas, pois os bezerros ficam menos dependentes do leite da mãe quando começam a comer suplemento e elas se recuperam mais cedo. “O bezerro cruzado espolia a mãe, que fica sentida. O creep ajuda muito a evitar esse desgaste”, diz o criador, que trabalha com dois protocolos de IATF, mais repasse.

Os bezerros já acessam o creep aos 40 dias de vida. Não há separação entre cruzados e Nelore, como seria ideal, segundo o produtor, porque não se viabiliza ainda. “Atrapalha no manejo da IATF”, justifica. O consumo projetado é de 560-600 g/cab/dia, com fornecimento diário e leitura de cocho. O criador diz não ter levantamento de valores, mas assegura que compensa o investimento na técnica. “A hora que o animal mais responde à suplementação é na cria”, diz ele, referindo-se ao custo mais baixo para se colocar de 1 a 1,5@ no bezerro.

Relação custo x benefício é positiva

Segundo ténicos ouvidos por DBO, o creep feeding é vantajoso. Danillo Barros Monteiro, diretor de inteligência mercadológica da Nutroeste, com sede em Goiânia, GO, fez uma simulação de custo x beneficio para mostrar isso (veja tabela). Segundo ele, a técnica é viável mesmo considerando-se o investimento em instalações. Um creep móvel, com capacidade para 100 animais, pode ser adquirido por R$ 3.000, o que resultaria no custo de R$ 30/cab, apenas 10% do lucro apurado na simulação, que foi de R$ 304/cab.

Mário Sérgio Spinosa Passolo, gerente regional da Premix, de Ribeirão Preto, SP, é ainda mais rigoroso na análise de custo x benefício, lançando na modalidade “sem creep”, o custo do sal mineral da mãe que o bezerro come. São 50 g/cab/dia por 245 dias. A R$ 2,31/kg, tem-se um custo de R$ 28,30/cab/período. No creep, o consumo é maior (370 g/cab/dia), mas o produto custa RS 1,53/kg, gerando despesa de R$ 138,6/período. Esse animal desmama com 245 kg, ante 205 kg do sem creep, e gera receita de R$ 2.250 (kg de PV a R$ 9), enquanto o outro dá R$ 1.845. Após subtração dos custos mencionados, tem-se um lucro 16,22% no creep.