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Que balbúrdia! Ao escrever esta coluna, o preço de referência da arroba do boi gordo no estado de São Paulo é de mais de R$ 225,00 à vista, segundo informação do boletim diário da Scot Consultoria. Estamos vivendo um período de recordes nominais diários desse índice. Ainda não é o maior valor real da história da arroba do boi gordo no Brasil; será que chegaremos lá? Se 2018 foi um ano de expectativas e incertezas devido ao cenário político, 2019 apresentou-se como um ano positivo para o mercado do boi gordo, embora também incerto e imprevisível.

O enorme mercado chinês interferiu diretamente nos preços praticados por aqui. A crise com a atividade suína naquele país, devido ao grave surto da peste suína africana que assolou os rebanhos chineses e de diversos outros países asiáticos e até mesmo no Leste Europeu levou a uma demanda crescente por alternativas àquela carne. E – que bom! – “sobrou” para o Brasil!

A China habilitou 25 frigoríficos para exportação de carne, sendo que 17 deles são produtores de carne bovina, de acordo com o Portal do Canal Rural. Esse fato alavancou as exportações brasileiras de carnes em geral, mas principalmente da carne vermelha. Mas – e sempre tem o mas – o preço da carne no varejo aqui no Brasil disparou. Estamos passando por um período em que o consumidor brasileiro irá sentir no bolso o aumento. Bom para o pecuarista, bom para o País, mas ruim para os churrasqueiros de plantão.

No entanto – e para que a análise não fique distorcida –, o aumento nas exportações de carne bovina não foi o único fator a elevar os preços desse produto. Não há boi no pasto. Esse fato foi previsto por diversos analistas já em meados de 2018. Alguns deles atribuíram à reabertura de várias plantas frigoríficas no País o encurtamento do ciclo pecuário, que fez com que o abate aumentasse e, como consequência, acarretasse na falta de animais ora verificada. O que esperar do boi em 2020?

Que baita oportunidade para o produtor! Preços em alta, falta de produto! Agora é a hora de o pecuarista mostrar sua eficiência, ganhar mercado, negociar com segurança. É a hora da gestão profissional!

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cresceu 1,1% em 2018, contra uma estimativa de 1,4% do Banco Central (BC), comentado aqui na coluna de dezembro de 2018. Essa redução não foi surpresa. Para 2019, há uma expectativa de crescimento da ordem de 0,91%, em relatório divulgado pelo BC no final de outubro. Segundo o CEPEA (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), o PIB do agronegócio brasileiro cresceu 1,38% de janeiro a agosto de 2019, quando comparado com o mesmo período do ano de 2018. Ainda de acordo com os pesquisadores do CEPEA, o desempenho positivo no acumulado de 2019, até agosto, está atrelado ao forte crescimento observado para o ramo pecuário, de quase 10%, contra um resultado negativo de 1,82% para o setor agrícola.

O quadro Exportações de carne bovina brasileira no período de janeiro a outubro de 2019 mostra que o Brasil exportou 1.471.867 de toneladas de carne bovina e derivados em 2019, um aumento de 11% em relação ao ano anterior. O valor total das transações foi de US$ 5.761.572.332,00, segundo a Abrafrigo (Associação Brasileira de Frigoríficos), que correspondeu a um acréscimo de 8% no faturamento em relação a 2018.

Esses números comprovam a solidez das exportações brasileiras neste setor, que vêm apresentando altas constantes e expressivas ano a ano. A busca por novos mercados, no entanto, deve se intensificar, pois não se pode confiar cegamente que os países importadores da nossa carne se mantenham fiéis eternamente.

O gráfico da Evolução do preço da arroba no mundo apresenta os valores praticados nas principais praças internacionais de janeiro a novembro de 2019. A arroba brasileira reagiu neste ano, ao contrário de 2018, quando o preço em dólares americanos baixou. A valorização ao longo do ano foi de 7,64%, passando de US$ 40,44 para US$ 43,53. O mês de setembro apresentou o menor valor do ano (US$ 38,37), para, em seguida, reagir fortemente até novembro. Na Austrália, outro grande exportador mundial, ocorreu o mesmo, com valorização da arroba de 3,26%, passando de US$ 55,43 para US$ 57,24. Já na Argentina e nos Estados Unidos ocorreu o inverso, com retração no valor da arroba do boi gordo em dólares americanos da ordem de 12,82% e 11,04%, respectivamente.

Analisando esse quadro, é possível concluir que a carne brasileira continua muito vantajosa quando comparada à carne vermelha exportada por Austrália e Estados Unidos. Nossa carne é mais barata e mais saudável que aquelas. Quando comparamos Brasil e Argentina, percebemos que nossos vizinhos praticam um preço bem inferior ao nosso, com larga vantagem nesse quesito (a preços de novembro em US$ 43,53, contra US$ 32,44). Essa diferença aumentou muito ao longo do ano de 2019.

O gráfico da Evolução do preço da arroba do boi gordo a prazo (a seguir) mostra o comportamento dos valores praticados de janeiro a 14 de novembro de 2019 nos principais estados produtores de carne vermelha no Brasil. Ao observarmos esse gráfico, verificamos que a tendência foi de alta ao longo de todo ao ano de 2019 em praticamente todos os estados. A exceção ficou novamente por conta do estado do Rio Grande do Sul, que apresentou os valores mais elevados no meio do ano, entre junho e julho, caiu abruptamente em seguida (meses de agosto e setembro) e se recuperou no final do ano. Os meses de outubro e novembro foram de forte alta para todos os estados analisados, o que é consequência da forte alta que tivemos no mercado como um todo.

Com alguns sinais de recuperação da economia – ainda fracos, é verdade –, o consumo interno aumentou um pouquinho. Esse fato ajudou na manutenção e no crescimento dos preços ao longo do ano, aumentando o escoamento interno da produção. Neste ano, não tivemos fatos pontuais que atrapalharam o mercado, como a greve dos caminhoneiros ocorrida em 2018 (embora ameaças não faltassem, muito mais como tentativas de desequilibrar o Governo do que propriamente por motivos sociais ou econômicos). O ano de 2019 não apresentou uma entressafra da carne bovina acentuada. Mesmo no período normalmente mais desfavorável, época seca do ano, os preços se mantiveram estáveis ou com leve alta.

O mercado se comportou em 2019 de forma totalmente inversa ao que aconteceu em 2018. Os preços se mantiveram em alta ao longo do ano, independentemente da oferta de animais. O quadro só se alterou em outubro e novembro, quando o valor da arroba subiu de forma exagerada e a oferta de gado caiu expressivamente. O fato é que o varejo sofre com a falta do produto, e o consumidor já pensa em como substituir a tão estimada carne vermelha no seu dia a dia.

O gráfico da Evolução do preço da desmama apresenta os valores praticados nas principais praças pecuárias brasileiras de janeiro a novembro de 2019. Os números mostram que há forte crescimento nos preços da reposição dessa categoria em todos os estados avaliados, sem exceção. Os preços dos bezerros, com esse comportamento, fizeram com que o ano de 2019 tenha sido altamente favorável para os criadores, como já vinha sendo mostrado por esta coluna ao longo do ano.

A evolução de preços do mercado de desmama no ano de 2019 foi bem acimada expectativa. De janeiro a novembro, os preços dessa categoria aumentaram, em média, 17,71%, contar 6,6% do ano de 2018. O estado do Pará foi aquele onde a desmama mais subiu (35,85%) e o de Minas Gerais, o que menos subiu (12,71%), sendo que o Mato Grosso foi aquele estado em que os preços mais subiram (12,87%). A média, no início do ano para os oito estados avaliados, foi de R$ 1.167,50; já no dia 14 de novembro, a mesma média bateu os R$ 1.371,38. A desmama, no estado de São Paulo, terminou o ano com o maior valor, R$ 1.480,00, e, no Rio Grande do Sul, com o menor: R$ 1.151,00.

Quando comparamos o mês de janeiro com o mês de novembro de 2019, os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Paraná, Pará e Rio Grande do Sul apresentaram aumentos no valor dessa categoria de 18,40%, 12,71%, 14,40%, 13,01%, 16,67%, 35,85%, 14,41% e 16,26%, respectivamente.

As relações de troca da reposição com o boi gordo acompanharam, de certa maneira, o comportamento da evolução do preço da arroba ao longo do ano de 2019. A seguir, o gráfico da Evolução da relação de troca do bezerro desmamado de oito meses de 180 quilos com o boi gordo de 16 arrobas apresenta os valores médios obtidos no decorrer do ano para cada estado.

A relação de troca média entre desmama e boi gordo para o ano de 2019 foi de 1,90. Esta relação caiu quando comparada ao ano de 2018, que foi de 2,04. Isso ocorreu devido à forte valorização da cria, conforme mostrado no gráfico da evolução do preço da desmama.

A comparação do início do ano de 2019 com o mês de novembro do mesmo ano nas principais praças pesquisadas nos mostra que as taxas de relação de troca nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Paraná e Rio Grande do Sul foram as seguintes, respectivamente: 1,91, 1,93, 1,77, 1,83, 1,75, 1,82, 1,94 e 2,27. As taxas caíram em todos os estados!

O gráfico da Evolução da relação de troca do boi magro de 12 arrobas com o boi gordo de 16 arrobas apresenta os valores médios obtidos no ano de 2019.

Diferentemente do que ocorreu com a relação de troca da desmama com o boi gordo a relação de troca boi magro/boi gordo iniciou o ano em alta, sofreu quedas ao longo do ano e terminou 2019 em forte alta, ou seja, a valorização da arroba do boi gordo foi bem mais acentuada do que a valorização do boi magro. A relação de troca média para esse quesito foi de 1,23, contra 1,24 para o ano de 2018, ou seja, um quadro de estabilidade.

Os estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Pará, Paraná e Rio Grande do Sul apresentaram as seguintes taxas: 1,20, 1,27, 1,15, 1,19, 1,19, 1,28, 1,20 e 1,35, respectivamente, comparando janeiro com novembro de 2019.

O ano de 2019 foi excelente para o setor de pecuária de corte no Brasil. A expectativa é de que continue assim. Vários dos problemas que o Brasil enfrentou em 2018 não aconteceram em 2019, apesar das várias incertezas que os cenários político e econômico ainda nos reservam.

Estamos vivenciando um período de vacas gordas no setor pecuário em função das consecutivas altas no preço da arroba do boi. Ótimo! O pecuarista merece ser bem remunerado e, porque não, recompensado pelo seu árduo trabalho no dia a dia. Porém não é porque tudo são flores que o produtor deve esquecer o fundamental: a gestão profissional! O planejamento da produção agropecuária é importante demais na época dos preços ruins e tão ou mais importante na época dos preços bons. Na baixa, a receita é usada para a manutenção, para o custeio diário da propriedade e para, quem sabe, remunerar o produtor. Mas e na alta? O montante arrecadado com a venda dos animais é usado para tudo aquilo que foi citado anteriormente, mas também para um item extremamente importante: o investimento!

Quem consegue crescer no período de baixa provavelmente tem uma gestão extraordinariamente bem-sucedida. Mas quem não consegue crescer no período de preços bons está fadado ao fracasso.

Vou repetir, aqui, uma frase usada na coluna de dezembro de 2018, pois se trata de um recado muito útil àqueles que realmente querem produzir com qualidade e rentabilidade: “O planejamento é a preparação necessária aos gestores de todo e qualquer segmento produtivo no sentido de garantir o resultado sustentável da sua atividade”.

O ano de 2020 promete ser, mais uma vez, muito positivo para o setor agropecuário. No caso da pecuária de corte, então, nem se fale! Será mesmo? Olhando a projeção do mercado futuro do boi gordo, talvez devêssemos ser menos otimistas. Mas vamos com confiança, com alegria, porém com os pés no chão. Tudo que sobe muito depressa pode cair também na mesma velocidade. O momento é da alta, a economia como um todo parece mostrar sinais firmes de recuperação, e a política, aos trancos e barrancos, parece não estar atrapalhando tanto, com a aprovação das tão necessárias e esperadas reformas.

Desejamos um próspero ano de 2020 a todos os leitores.

Autor: Antony Sewell, sócio e consultor da Boviplan Consultoria Agropecuária.
Matéria publicada na Revista AG – Guia AG do Criador – 2020