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Ao abrir mão de assistência técnica especializada para o controle de parasitas, pecuária brasileira perde rendimentos produtivos e financeiros

Por JOÃO PAULO MONTEIRO
joao@ciasullieditores.com.br

Produzir animais de um elevado padrão de qualidade é uma arte. Incontáveis são as adversidades para o pecuarista, então, manter todo um sistema em equilíbrio e sintonia é um desafio e tanto. Dessa forma, gastar alguns minutos contemplando os animais no pasto é semelhante a observar uma obra em um museu. Por trás da imagem, há muito esforço, inspiração, criatividade e beleza envolvidos.

E assim como uma mancha em uma pintura, a presença de carrapatos, moscas e bernes nos animais pode arruinar toda o encanto da cena.

Porém, muito além da acabar com a beleza, esses parasitas impactam no bolso do produtor rural. Quando os animais estão “sujos”, eles perdem nutrientes e parte da produção de carne e leite é consumida. Essa é a maior consequência negativa, indica Leydson Ferreira Martins, gerente de Produtos Pecuária do Biovet Vaxxinova.

Porém, a ação dos parasitas e os reflexos negativos formam uma extensa lista. Tanto pela ação direta, resultando em lesões no trato digestivo, incômodo aos animais, irritação, consumo de nutrientes e espoliação do couro, dentre outras; como também de modo indireto, ou aqueles compreendidos por doenças onde os parasitas são os transmissores, a exemplo da tristeza parasitária bovina.

“Além de todos os outros prejuízos decorrentes ao parasitismo, como aquisição de medicamentos e a morte de animais”, complementa Eduardo Henrique Rezende, coordenador de Marketing e Comunicação Científica da J.A Saúde Animal.

Deste modo, as possibilidades são tantas que é até difícil pontuar cada uma delas, mas, em geral, as ações dos parasitas levam ao menor ganho de peso, menor produção de leite, piora nos índices reprodutivos e aumento de mortalidade.

Em 2014, o professor da UFRRJ Laerte Grisi e colaboradores publicaram um estudo e apresentaram dados alarmantes. Os prejuízos potenciais das seis principais parasitoses de bovinos no Brasil poderiam atingir em torno de 14 bilhões de dólares.

“Fazendo uma conta direta, seria uma perda de aproximadamente 340 reais por cabeça/ano”, insere Matheus Marinho, gerente de Produtos – Gado de Corte da Elanco. “E existem propriedades com bom manejo e com perdas minimizadas; então, certamente também há produtores perdendo muito mais que esse valor por animal em sua atividade”, acrescenta.

O gerente técnico de Grandes Animais da Boehringer Ingelheim, Roulber Silva, acrescenta informações ao debate. Segundo o profissional, estudos apresentados durante o Congresso Brasileiro de Buiatria em 2019 mostram o desempenho de bovinos na recria, em São Paulo e Goiás. Esses dois grupos, um tratado e outro não, foram analisados em um período de 150 dias. Em SP, constatou-se 30,7 kg a mais de ganho de peso e, em Goiás, um ganho de 18,6 kg foi verificado: “Isso demonstra o impacto e a importância do controle parasitário no desempenho dos animais”.

Estimativas apresentadas pelo médico veterinário Ingo Mello, gerente do departamento Técnico de Animais de Produção da Ourofino Saúde Animal, corroboram. As perdas produtivas podem chegar até 40kg/animal na fase de recria, ele afirma, além de uma redução de até 25% na produção de leite, dependendo do animal e do grau de infestação.

A VISÃO DO CONSULTOR

Os mecanismos de contaminação dos animais e as formas mais eficientes de controle das parasitoses já são amplamente pesquisados e estabelecidos quanto à eficiência de princípios ativos, doses e formas de tratamento. O que explica, portanto, o problema ainda ser recorrente na pecuária brasileira?

Quem nos ajuda e compreender esse cenário é o médico veterinário Felipe Marinho, consultor Técnico da Boviplan, companhia que atua nas áreas de consultoria e assistência técnica em pecuária intensiva desde 1983.

“Primeiramente, ainda existe uma negligência na hora da elaboração dos calendários sanitários da propriedade”, ele inicia. Segundo orienta o consultor, o ciclo do parasito alvo, histórico de incidência, condições edafoclimáticas, categoria animal e exames de eficiência de controle devem servir como base para esse planejamento.

Além disso, alerta Felipe, a falta de alternância de classes de antiparasitários pode gerar resistência nas populações de parasitos, tornando as infestações recorrentes. Ainda, outro fator comum nas fazendas é o erro na hora da aplicação. “Aqui incluo perda de produto, erro de local de aplicação, super ou sub doses”, exemplifica.

E, por fim, pontua, a inexistência ou ineficiência de controle de infestação parasitária. “É de extrema importância para retardar ou prevenir o estabelecimento de resistência e manter a eficiência dos antiparasitários”, argumenta.

Esse conjunto de fatores todos deixa claro: é impossível determinar um protocolo padrão. Cada propriedade deve ser analisada individualmente para estabelecer a forma adequada para proceder, pensando naquela determinada região e animais em questão.

Isso porque diversos elementos devem ser considerados, elenca o consultor: “Características climáticas, espécie animal, raça, categoria (idade e sexo), origem em caso de compras, histórico de incidência de parasitos da região, atividade desenvolvida, grau de intensificação e histórico de uso de classe de antiparasitário”.

Uma possibilidade interessante nesse sentido são os sistemas integrados. “Ao intercalar a produção de pasto com culturas anuais há quebra do ciclo tanto dos animais quanto das culturas anuais”, explica Felipe. Dessa forma, após um período de produção de grãos a área é considerada praticamente livre de parasitos de bovinos.

Mas, como bem reforça o consultor, “não é possível eliminar completamente os agentes”. Portanto, mesmo em sistemas integrados ainda se faz necessário um controle estratégico, visando a manutenção desses níveis baixos ao longo do tempo.

Neste tipo de sistema, o consultor cita as recomendações propostas pela Embrapa: “O principal cuidado é realizar um tratamento tático para controle prévio de ecto e endoparasitos em animais até 18 meses de idade, para que quando sejam introduzidos nessa área de integração não contaminem o ambiente com grandes cargas parasitárias”.

Independente do sistema produtivo, os parasitas causam impactos econômicos quando ultrapassam a capacidade de tolerância do animal, reduzindo a sua produção diária. “Quando a população é grande o suficiente para gerar competição por nutrientes com o hospedeiro, ou mesmo, quando há uma menor absorção destes no trato gastrointestinal, ou ainda, se há grande perda de sangue”, explica Felipe.

Em se tratando de parasitos intestinais, a literatura científica disponível indica uma maior capacidade por parte de animais mais velhos de manter um nível baixo de vermes a ponto de não causar interferência no seu desenvolvimento e desempenho. No caso de parasitos externos, como carrapatos e moscas, esse comportamento não é visualizado. “Garantir o controle com práticas integradas é necessário para amenizar ou evitar efeitos negativos”, conclui o consultor.

O impacto econômico é resultado principalmente de um retardo de desenvolvimento e perda de desempenho produtivo. “O animal infestado pode chegar a diminuir em 20% seu ganho diário. E, em casos mais graves, podese levar a morte, causando danos econômicos maiores”, insere Felipe.

CADA CASO É UM CASO

“Pela minha experiência, grande parte dos produtores, muitas vezes, não sabem que esse problema existe dentro do seu sistema”, revela Felipe Marinho.

A pecuária brasileira é realmente muito diversa. Enquanto há quem encare a fazenda com profissionalismo, enxergando os protocolos sanitários como investimento, em contraste, há produtores reativos. “Entendem os tratamentos apenas como despesa, tratando apenas animais muito infestados”, indica Eduardo Rezende, da J.A Saúde Animal.

Diante desta mentalidade, é recorrente a utilização de produtos visando combater os parasitas simplesmente baseada no preço, sem algum conhecimento acerca da qualidade e confiabilidade. “Ou até chegam a buscar alternativas não recomendadas para aplicação em animais”, lamenta o consultor da Boviplan. E de acordo com o profissional da J.A Saúde Animal, não é impossível ver no campo misturas caseiras, associando medicamentos com óleo queimado, por exemplo.

Nesses casos, é evidente não haver indicação de um profissional da área, muito menos um acompanhamento baseado em exames clínicos e laboratoriais. E, mesmo ao utilizar produtos de qualidade, é possível ainda que esse produtor cometa erros de manejo, elevando o custo sanitário da empresa desnecessariamente. “Na tentativa de economizar, diluem de forma incorreta ou utilizam doses menores. Práticas que reduzem a eficácia do tratamento estimulam a resistência parasitária e dificulta o combate, causando prejuízos momentâneos e futuros ao rebanho”, analisa Eduardo.

Isso evidencia o impacto do fator cultural sobre os prejuízos ainda causados pelos parasitas na atividade. “Ao invés de buscar uma assistência técnica qualificada, entendendo que cada fazenda tem uma realidade diferente, muitos pecuaristas têm o hábito de usar o mesmo produto que o vizinho usou, ou o mesmo produto que já está usando há muitos anos, ou então o que está mais barato na hora da aquisição”, analisa Matheus Marinho. O gerente da Elanco conclui: “Isso traz prejuízos para a atividade, inclusive acelerando o processo de aparecimento da resistência parasitária aos produtos disponíveis no mercado”.

Mais um alerta é feito por Leydson Martins, do Biovet Vaxxinova. Uma grande parcela de produtores baseia o controle parasitários nas campanhas de vacinação contra febre aftosa. Apesar de prático, esse modelo já se mostrou ultrapassado. “Não combate a população de vermes no meio da estação seca”, justifica.

Os apontamentos apresentados deixam claro: não existe uma receita única, capaz de servir a todas as propriedades. “Cada fazenda tem uma realidade e o protocolo de controle parasitário deve ser adequado à realidade referente aos desafios, sazonalidade, manejos, rebanho, categorias e sistema de produção”, resume Roulber Silva, da Boehringer.

Deste modo, a orientação de especialistas para melhorar a produtividade e lucratividade dos negócios é imprescindível. “Por isso, nós, da indústria, temos que estar preparados para oferecer este tipo de consultoria e serviço”, afirma Roulber.

Ingo Mello, da Ourofino, corrobora. “A maioria dos erros está em subestimar os parasitas e sua epidemiologia. Muitos deixam para iniciar o controle tarde, tornando difícil manter os animais limpos e sadios. É preciso contar com o suporte técnico de profissionais experientes e especialistas, deter- minando o momento correto, o protocolo mais apropriado e a utilização de produtos devidamente provados quanto à eficácia e segurança, respeitando sempre o período de carência”.

Os erros e a forma como a sanidade animal é encarada podem ser explicados pela baixa representatividade nos custos de produção, em torno de 2% a 5%. “O produtor tende a concentrar esforços em temas que demandam maiores investimentos, como nutrição e mão de obra”, analisa Mateus Marinho e adverte: “Não podemos nos esquecer que mesmo custando pouco, a sanidade pode ter um impacto negativo muito grande caso não seja bem gerenciada”.

UM OLHAR PARA O FUTURO

As ferramentas disponíveis atualmente, se bem utilizadas e sob supervisão, são eficazes e viáveis economicamente. “Sistemas rotacionados de pastagens, controles estratégicos de parasitos e rotação de antiparasitários”, ilustra Felipe Marinho.

Mesmo assim, há grandes aportes em pesquisa de novas soluções para o controle e combate dos parasitas. “A ciência não para”, confirma Leydson Martins. Segundo o gerente do Biovet Vaxxinova, existem esforços para descobrir novas bases químicas, combinações e veículos com diferentes padrões de liberações.

Porém, como sabemos, existem desafios para o surgimento desses produtos. O principal deles talvez seja a burocracia. “Pode levar mais de cinco anos dentre o início das pesquisas até a comercialização de um novo medicamento”, informa Eduardo Rezende.

Outra dificuldade é a constante evolução dos parasitas, acelerada pela utilização inadequada dos endectoparasiticidas. A mosca dos estábulos, para exemplificar tal questão, se tornou resistente aos atuais antiparasitários. “É um sinal de alerta para maior conscientização dos técnicos e pecuaristas para o correto manejo e utilização dos protocolos medicamentosos”, indica o gerente da J.A.

O consultor da Boviplan concorda. Diante da complexidade para o desenvolvimento de novos princípios ativos, existe um esforço muito grande na busca de novas ferramentas e tecnologias para serem utilizadas no lugar dos tratamentos químicos ou em associação aos mesmos. “Vacinas, controle biológico, seleção genética e fitoterapia, como óleos essenciais”, informa Felipe.

De uma forma ou de outra, a certeza é que o mercado de saúde animal segue em plena evolução e em busca de novas ferramentas e tecnologias para mitigar o impacto dos parasitas na pecuária. “É fundamental que as empresas do setor estejam sempre atentas às necessidades dos produtores para desenvolver soluções de impacto”, assinala Roulber Silva e confirma: “E não devemos nos atentar apenas em moléculas, mas ao tipo de controle ou tratamento adequado que deve ser realizado, como controle tático, estratégico ou seletivo”.

Matheus Marinho compartilha desse pensamento. “Os investimentos em pesquisa e desenvolvimento de soluções para controle de parasitas não param”.

E, para o futuro, projeta o profissional da Elanco, com a chegada em peso da tecnologia no meio rural haverá um salto na qualidade do controle de parasitas. “Primeiro, pois a informação está cada dia mais disponível; são centenas de sites, portais e lives com conteúdos importantes sobre o tema. Além disso, novas tecnologias como detecção por foto da infestação por parasitas externos, ferramentas de diagnóstico a campo, aplicativos para elaboração de calendário sanitário, entre outros, certamente vão auxiliar o pecuarista a mitigar os impactos causados pelos parasitas”.

Leydson Martins concorda e conclui: “O certo é que a pecuária exigirá cada vez menos erros sanitários, pois não haverá mais espaço para perder produtividade para os parasitas”.